março 27, 2007




Vestígios


noutros tempos

quando acreditávamos na existência da lua

foi-nos possível escrever poemas e
envenenávamo-nos boca a boca com o vidro moído
pelas salivas proibidas - noutros tempos
os dias corriam com a água e limpavam
os líquenes das imundas máscaras

hoje
nenhuma palavra pode ser escrita

nenhuma sílaba permanece na aridez das pedras
ou se expande pelo corpo estendido
no quarto do zinabre e do álcool - pernoita-se
onde se pode - num vocabulário reduzido e
obcessivo - até que o relâmpago fulmine a língua
e nada mais se consiga ouvir

apesar de tudo
continuamos e repetir os gestos e a beber
a serenidade da seiva - vamos pela febre
dos cedros acima - até que tocamos o místico
arbusto estelar

e o mistério da luz fustiga-nos os olhos
numa euforia torrencial

Al-Berto

2 comentários:

grey disse...

Vim só mandar um beijo. Tenho esse poema há muito tempo no meu blog...é um dos meus preferidos de Al Berto, do "Horto de incêndio".

fica bem

Lowprofile disse...

grey:
Coincidência ;)
só me deram a conhecer Al Berto ontem.adorei.
bjoc